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quarta-feira, 6 de junho de 2012


carteira profissional do artista

Belmiro Carlos: “A carteira profissional do artista não pode ser tida como peça de adorno”

Como vai o processo de atribuição da Carteira Profissional do Artista? 
O processo decorre normalmente, como previsto. Estamos a viver um período de mora, para aprofundar o trabalho de esclarecimento e consciencialização. A qualquer altura se decreta a obrigatoriedade da carteira para a actividade artística remunerada.
Que reacções tiveram ao nível da classe, sobretudo na capital do país? 
A reacção é boa. Estamos a começar e há já cerca de duas centenas de solicitações. O que é mais gratificante é que essas solicitações vêm de todos os lados que conformam a classe. Jovens, veteranos, sembistas, kuduristas, rapers, etc; Do Huambo, de Benguela de Luanda, de Cabinda, etc., etc.
E mais… vamos atribuir as carteiras independentemente da cor partidária, do credo religioso, raça e outros pseudo-constrangimentos do solicitante. A UNAC é uma instituição apartidária. Tem nas suas fileiras desde os serviços administrativos até aos órgãos de direcção, pessoas de diferentes cores políticas, por isso a nossa acção nesse domínio não pode ser diferente.
Permita-nos reiterar que a carteira profissional do Artista é um instrumento para facilitar a luta pelo resgate do respeito e dignidade. E, no nosso entender, respeito e dignidade não são aqui palavras ocas, elas têm de ser prenhes de conteúdo.
E o conteúdo, aqui, significa acesso organizado e privilegiado ao trabalho, acesso aos créditos, aos serviços sociais, à superação profissional, à protecção social, aos incentivos, ao serviço personalizado junto da nossa instituição, etc. etc. E, respeito e dignidade são, também, porque não, o apuramento da classe na responsabilidade cívica, ética e social.
 Nós não temos dúvidas que a carteira profissional vai ajudar a resgatar o respeito e a dignidade da profissão de artista. A carteira não pode ser tida como uma peça de adorno, nem ser reduzida a um documento de identificação apenas, daí que ela só será atribuída a quem provar merecer e necessitar dela.
UNAC 31 anos depois, que balanço faz da vossa actividade?  
No cômputo geral, naquilo que é essencial, achamos positivo. Temos a organização a funcionar a um ritmo aceitável, tendo em conta as nossas possibilidades humanas e financeiras, há uma vida orgânica regular, os órgãos funcionam, deliberam, executam e controlam. Por isso, resumidamente, podemos dizer que a UNAC vai bem e recomenda-se.

O que já foi feito e o que falta por fazer em defesa da classe? 
Infelizmente, por razões conjunturais a instituição hibernou durante algum tempo e para levantar voo novamente teve que fazer algum trabalho de casa como organizar e informatizar os seus serviços administrativos, expandir a instituição para algumas províncias, uniformizar procedimentos, actualizar a estatística, etc.
E, tudo isso fez com que se adiasse a realização do seu principal objectivo de velar pelos interesses sócio-profissionais da classe. Assim, podemos dizer que só agora, com a segurança social e a introdução da carteira profissional iniciamos, de facto, a tocar nas questões estruturantes que podem concorrer para uma real inserção e realização social e profissional dos artistas.
Respondendo concretamente à pergunta, temos ainda muito a fazer.
Aliás, a actividade da UNAC é dinâmica, porque as suas responsabilidades vão-se adaptando às exigências dos seus associados que, certamente, hão-de ser cada vez maiores e mais complexas. É preciso desencadear acções que garantam trabalho aos associados, saber como é que vamos conduzir o trabalho artístico nos hotéis e similares.
 Prevê-se um crescimento exponencial do turismo em Angola.
Nós queremos que esses postos de trabalho sejam ocupados por artistas angolanos, sem qualquer xenofobia.
Queremos regras para a coabitação.
Por outro lado, se calhar vamos ter que lidar com conflitos laborais de outra dimensão e complexidade que nos deverão forçar a evoluirmos para um sindicato.
 O artista, devido as características peculiares da sua actividade, é normalmente intermitente, observa horários de trabalho complexos, a idade de reforma dos artistas, particularmente no caso dos dançarinos é precoce, a existência da actividade patronal no espaço da actividade artística, etc., etc. o Artista vai necessitar de um regime laboral especial. A Lei Geral do Trabalho não responde às nossas necessidades.
Mas isso é uma outra batalha…  Como vê, isso é só a ponta do iceberg, mas pode entender o muito que ainda há a fazer pela frente.
Que outras acções foram até aqui desenvolvidas no sentido de disciplinar a actividade artística no país?
A acção mais relevante e de carácter estruturante foi da introdução da carteira profissional do artista. Não temos dúvidas que é um instrumento importante na estruturação, organização e monitorização da actividade artística no país.
A carteira vai disciplinar o acesso e proporcionar a defesa dos postos de trabalho aos artistas angolanos. A nossa tão desejada dignidade só será alcançada com trabalho.
É um documento que vai facilitar o exercício da cidadania por parte dos nossos artistas. Desse modo os nossos interesses vão ser analisados, apresentados e defendidos de forma mais consensual, acutilante e com maior eficácia.
A introdução da carteira é certamente o passo mais importante de reconhecimento que se deu no país, para a valorização e dignificação da actividade dos artistas. Pode crer que muita coisa vai mudar.
Surgirão postos de trabalho, incentivos da parte do Estado e dos bancos, para os empresários culturais e, porque não, para os próprios artistas. Ainda vem pela frente muito trabalho de consciencialização da classe e parceiros.
Com esta mesma carteira profissional, os artistas vão ser tratados como os restantes profissionais, com todos os direitos que esses usufruem e num futuro não muito longínquo não serão vistos de soslaio, nem ser questionados se “para além de artista o que é mais que faz?”
Constou-nos que a UNAC está a preparar-se para a construção de novas instalações. Em que pé está o processo e em que zona da cidade capital será erguida? 
É verdade. Estávamos empenhados na aquisição de terreno em Viana para construção a de uma nova sede, pois que a actual está a cair de podre, conjuntamente com o edifício onde estamos situados. Infelizmente e incompreensivelmente o nosso terreno esfumou-se e com ele o sonho da sede nova. Aproveito para lançar um SOS às autoridades, porque as condições em que nos encontramos não dignificam a llasse, nem o país.
Somos uma instituição de utilidade pública… A problemática da recolha e distribuição dos direitos de autor é uma outra questão que merece ser levada em consideração. Que passos tendem têm sido dados?  Esse é um verdadeiro cancro para a economia dos artistas angolanos.
Infelizmente 30 anos depois da independência nacional, o país ainda não conseguiu estabelecer uma máquina funcional nesse capítulo. O que representa hoje um atentado à nossa Constituição.
O entendimento da UNAC é que o direito do autor é um assunto privado e é nessa perspectiva que tem de ser tratado. Considerando a inépcia demonstrada pelos organismos que lidam com essa matéria, oportunamente a UNAC pensa chamar a si a responsabilidade de se corrigir o actual estado de organização da recolha e distribuição dos direitos de autor no país. O actual Governo tem na forja uma nova lei sobre os direitos de autor. Estamos a aguardar por ela para que iniciemos a empreitada.
O que nos tem a dizer sobre o fundo de apoio às actividades culturais? 
Temos estado a dizer que para maior e melhor produtividade do fundo, o mesmo precisa de resgatar o espírito que lhe deu origem.
 Que comentários faz sobre a Lei do Mecenato? 
A Lei do Mecenato só irá se transformar num instrumento de capital importância para a revitalização da vida artística se ela for convenientemente regulamentada, caso contrário ficaremos dependentes dos caprichos dos senhores empresários, e nalguns casos mesmo, essa Lei poderá ser usada para outros fins inconfessos, que não os culturais.
Augusto Nunes
in Jornal O País de1-6-2012

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