Diversionismo na gestão da
Propriedade Intelectual
Embora o conjunto dos direitos de
propriedade industrial com o dos direitos de autor constituam o que
internacionalmente se convencionou chamar de Propriedade Intelectual, os mesmos
têm sido, por razões óbvias ,institutos disciplinados em diplomas legais distintos.
Porque:
1º) O Direito de Autor é o ramo do Direito Civil, que regula as relações jurídicas advindas
da criação e da utilização econômica de obras intelectuais estéticas ,
relativas a literatura, as artes e as ciências que visam o deleite, a beleza, a
sensibilização, o aperfeiçoamento intelectual, e os prazeres da alma.
2º) Os direitos de propriedade industrial , pertence ao Direito
Comercial, regulam as relações referentes às obras de cunho utilitário,
consubstanciadas em bens materiais de uso econômico, ou doméstico, de bens
finais resultantes da criação, como, por exemplo, móveis, automóveis, máquinas,
aparatos e outros, por meio de patentes e marcas.
3º) O Direito de Autor, em Angola é regulado pela Lei nº 15/14 de 31 de Julho, Lei dos Direitos
de Autor e Conexos, enquanto que o outro é orientado pela Lei n.º
3/92 de 28 de Fevereiro 1992 , Lei da Propriedade
Industrial.
4º) A titularidade de propriedade
industrial se origina de um acto administrativo de natureza constitutiva, asssente
no registo, no Instituo da Propriedade Intelectual, no Ministério da Indústria,
para que se possa reivindicar o direito de exploração
econômica exclusiva.
5º) Ao contrário , a titularidade
de autoria , não depende de qualquer acto
administrativo. É certo que a Lei prevê o registo das obras, no
órgão competente pela gestão administrativa de direitos de autor e conexos, mas
apenas para eficácia dos direitos previstos por Lei, para efeitos
constitutivos, declarativos ou de publicidade.
Como podemos facilmente entender, e isso não
constitui nenhuma novidade para quem como nós passou à condição de mobília do convento, os problemas de
gestão dos direitos dos autores dos doutores da alma , são diferentes dos inventores de marcas e patentes.
Nos termos da Lei, o
Autor é o único que pode explorar a sua obra, gozar dos benefícios morais e
econômicos resultantes dela ou ceder os direitos de exploração a terceiros.
Mas e apesar da Lei , os artistas ,
impotentes , vêem as suas obras a serem vilipendiadas, violadas, usurpadas e o
produto económico das mesmas arrogante
e fraudulentamente sonegado, porque o Estado, através do MINCULT cede direitos
de exploração à terceiros, a coberto da falta de regulamentação da Lei, publicada há exatamente 3 anos.
As músicas dos artistas, em Angola
,continuam a ser usadas por usuários económicos, com o beneplácito do
Ministério da Cultura, para quem, pelos vistos,
a lei só tem validade num sentido, e , por isso, cauciona à terceiros o uso de propriedade
alheia (a música) para fins comerciais , sem que os donos (os autores),
usufruam os
direitos determinados por Lei .
Igualmente, o funcionamento de entidades de gestão colectiva
no País encontra-se pendente da
aprovação e promulgação do tal Regulamento, como desesperadamente advoga o
Ministério da Cultura .
Como se vê, Isso não acontece em
sede da gestão dos direitos da propriedade industrial
Então poque carga d´água se
pretende tornar moda no País, analisar e discutir conjuntamente os problemas
dos artistas e dos inventores, se os sonhos destes, apesar de maturados a partir do mesmo centro
de gravidade, assumem no final formas e conteúdos diferentes?
O
Artista duvida da seriedade desse processo , e desconfia das intenções do
MINCULT que diz promover tais
discussões para reflectir sobre a necessidade de se tornar efectiva e funcional
o sistema nacional de direitos de autor.
Aprofundam-se as decepções as frustrações, e incrédulos, os artistas,
maldizem o presente e questionam o futuro.
O Estado, em matéria de gestão dos
direitos de autor, está a actuar em
função de projecções resultantes do estado anémico e moribundo que provocou ao sistema de gestão colectiva, que,
particularmente, através da UNAC-SA , se ia firme e paulatinamente implantando
em todo o País.
O MINCULT , em relação aos direitos
de autor, tem que adoptar uma postura onde os interesses de todas as partes
fiquem salvaguardados. Não é lícito que o MINCULT continue a autorizar o uso de
obras por parte de usuários económicos em prejuízo dos seus autores.
Os artistas não podem continuar
reféns da inércia e inépcia do Ministério.
Não tendo o MINCULT conseguido em 3
anos fazer aprovar o Regulamento da Lei
e a Tabela de Cobrança , é lícito que à Classe artística lhe seja dada a
possibilidade de corrigir o comportamento discriminatório e ilegal do MINCULT,
para fazer vingar a Lei e usufruir dos seus direitos.
As Tabelas de Cobrança e
Regulamentos de funcionamento, já foram há muito inventadas, e essas podem ser usadas para, entre nós, aguçar o bom
senso e servir de bitola para o funcionamento de entidades de gestão colectiva
de direitos de autor em Angola. Isso , enquanto
o lobo não vem...
Aliás, nesse andar, não se espantem
se qualquer dia começarem a ouvir falar
de indemização colectiva por violação consciente , reiterada e prolongada dos direitos dos artistas, no nosso País.
Mas...
Uma vez que passado esse tempão (3
anos) o artista continua no cafrique do MINCULT, será mesmo que o Ministério
com a realização desses seminários nacionais
e internacionais procura inteligência para tornar efectiva e funcional o sistema nacional de direitos de autor , ou estamos simplesmente em presença de mais algumas piruetas de show
off?
Belmiro Carlos
Músico e compositor
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