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terça-feira, 30 de maio de 2017

Diversionismo na gestão da Propriedade Intelectual

Embora o conjunto dos direitos de propriedade industrial com o dos direitos de autor constituam o que internacionalmente se convencionou chamar de Propriedade Intelectual, os mesmos têm sido, por razões óbvias ,institutos disciplinados em diplomas legais distintos.
Porque:
1º) O Direito de Autor é o ramo do Direito  Civil, que regula as relações jurídicas advindas da criação e da utilização econômica de obras intelectuais estéticas , relativas a literatura, as artes e as ciências que visam o deleite, a beleza, a sensibilização, o aperfeiçoamento intelectual, e os prazeres da alma.
2º) Os direitos de propriedade industrial , pertence ao Direito Comercial, regulam as relações referentes às obras de cunho utilitário, consubstanciadas em bens materiais de uso econômico, ou doméstico, de bens finais resultantes da criação, como, por exemplo, móveis, automóveis, máquinas, aparatos e outros, por meio de patentes e marcas.
3º) O Direito de Autor, em Angola  é regulado pela Lei nº 15/14 de 31 de Julho, Lei dos Direitos de Autor e Conexos, enquanto que o outro é orientado pela  Lei n.º 3/92 de 28 de Fevereiro 1992 , Lei da Propriedade Industrial.
4º) A titularidade de propriedade industrial se origina de um acto administrativo de natureza constitutiva, asssente no registo, no Instituo da Propriedade Intelectual, no Ministério da Indústria, para que se possa reivindicar o direito de  exploração  econômica exclusiva.
5º) Ao contrário , a titularidade de  autoria , não depende de qualquer acto administrativo. É certo que a Lei prevê o registo das obras, no órgão competente pela gestão administrativa de direitos de autor e conexos, mas apenas para eficácia dos direitos previstos por Lei, para efeitos constitutivos, declarativos ou de publicidade.
Como  podemos facilmente entender, e isso não constitui nenhuma novidade para quem como nós passou à condição de mobília do convento, os problemas de gestão  dos direitos dos autores dos doutores da alma ,  são diferentes dos inventores de marcas e patentes.
Nos termos da Lei, o Autor é o único que pode explorar a sua obra, gozar dos benefícios morais e econômicos resultantes dela ou ceder os direitos de exploração a terceiros.
Mas e apesar da Lei , os artistas , impotentes , vêem as suas obras a serem vilipendiadas, violadas, usurpadas e o produto económico das mesmas   arrogante e fraudulentamente sonegado, porque o Estado, através do MINCULT cede direitos de exploração à terceiros, a coberto da falta de regulamentação da Lei,  publicada  há exatamente 3 anos.

As músicas dos artistas, em Angola ,continuam a ser usadas por usuários económicos, com o beneplácito do Ministério da Cultura, para quem, pelos vistos,  a lei só tem validade num sentido, e , por isso,  cauciona à terceiros o uso de propriedade alheia (a música) para fins comerciais , sem que os donos (os autores), usufruam os direitos determinados por Lei .
Igualmente, o  funcionamento de entidades de gestão colectiva no País encontra-se pendente   da aprovação e promulgação do tal Regulamento, como desesperadamente advoga o Ministério da Cultura .
Como se vê, Isso não acontece em sede da gestão dos direitos da propriedade industrial
Então poque carga d´água se pretende tornar moda no País, analisar e discutir conjuntamente os problemas dos artistas e dos inventores, se os sonhos destes,  apesar de maturados a partir do mesmo centro de gravidade, assumem no final formas e conteúdos diferentes?
O Artista duvida da seriedade desse processo , e desconfia das intenções do MINCULT que diz promover tais discussões para reflectir sobre a necessidade de se tornar efectiva e funcional o sistema nacional de direitos de autor.

Aprofundam-se as decepções  as frustrações, e incrédulos, os artistas, maldizem  o presente e questionam o futuro.

O Estado, em matéria de gestão dos direitos de autor,  está a actuar em função de projecções resultantes do estado anémico e moribundo que provocou ao  sistema de gestão colectiva, que, particularmente, através da UNAC-SA , se ia firme e paulatinamente implantando em todo o País.
O MINCULT , em relação aos direitos de autor, tem que adoptar uma postura onde os interesses de todas as partes fiquem salvaguardados. Não é lícito que o MINCULT continue a autorizar o uso de obras por parte de usuários económicos em prejuízo dos seus autores.
Os artistas não podem continuar reféns da inércia e inépcia do Ministério.
Não tendo o MINCULT conseguido em 3 anos fazer aprovar  o Regulamento da Lei e a Tabela de Cobrança , é lícito que à Classe artística lhe seja dada a possibilidade de corrigir o comportamento discriminatório e ilegal do MINCULT, para fazer vingar a Lei e usufruir dos seus direitos.
As Tabelas de Cobrança e Regulamentos de funcionamento, já foram há muito inventadas, e essas  podem ser usadas para, entre nós, aguçar o bom senso e servir de bitola para o funcionamento de entidades de gestão colectiva de direitos de autor em Angola. Isso , enquanto o lobo não vem...
Aliás, nesse andar, não se espantem se qualquer dia começarem a ouvir  falar de indemização colectiva por violação consciente , reiterada e prolongada dos  direitos dos artistas, no nosso País.
Mas...
Uma vez que passado esse tempão (3 anos) o artista continua no cafrique do MINCULT, será mesmo que o Ministério com a realização desses seminários nacionais  e internacionais procura inteligência para tornar efectiva e funcional o sistema nacional de direitos de autor , ou estamos simplesmente em presença de mais algumas piruetas de show off?
Belmiro Carlos

Músico e compositor

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